O Ministério da Educação (MEC) estuda alterar pontos da reforma do ensino médio aprovada durante o mandato de Michel Temer. Mas a proximidade com o ensino técnico, um dos pilares das mudanças propostas pelo ex-presidente, deve ser mantida e é defendida pela atual gestão para inserir os jovens mais rapidamente no mercado de trabalho. “A ideia de universidade para todos não existe”, afirma Ricardo Vélez Rodríguez, ministro da Educação, em entrevista exclusiva ao Valor, a primeira desde que foi indicado ao cargo, em novembro do ano passado.
Segundo ele, não faz sentido um advogado estudar anos para virar motorista de Uber. “Nada contra o Uber, mas esse cidadão poderia ter evitado perder seis anos estudando legislação”, diz. Para o novo comandante do MEC, o retorno financeiro dos cursos técnicos é maior e mais imediato do que o da graduação, o que pode a diminuir a procura por ensino superior no Brasil.
“As universidades devem ficar reservadas para uma elite intelectual, que não é a mesma elite econômica [do país]”, diz Vélez, ressaltando que busca um modelo parecido ao de países como a Alemanha. Segundo o ministro, não está em estudo a cobrança de mensalidades em universidades públicas, mas é urgente reequilibrar seus orçamentos. O ministro também defende a continuidade do enxugamento do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), iniciado por Temer.
Cercado de seus principais assessores e secretários de primeiro escalão durante a entrevista, Vélez diz que elabora apenas as diretrizes do que deverá ser a marca de sua gestão à frente do MEC, com metas alinhadas ao slogan “Menos Brasília, mais Brasil” do governo de Jair Bolsonaro. Os diagnósticos e elaboração de programas ficam a cargo de seus secretários, que ainda estão se debruçando sobre as medidas de gestões anteriores.
Além do ministro, falaram ao Valor Luiz Antônio Tozi (secretário-executivo), Tania Leme de Almeida (secretária de educação básica), Carlos Francisco de Paula Nadalim (secretário de alfabetização) e Mauro Luiz Rabelo (secretário de ensino superior).
A linha de ação central do novo governo, diz, será “uma virada brusca” do MEC para atender os municípios com apoio financeiro e técnico. “As pessoas chegaram até a escola, é hora de a escola chegar às pessoas”, afirma. Os detalhes que vão viabilizar a iniciativa, porém, são desconhecidos.
Tido como ministro da ala dos “ideológicos” de Bolsonaro, Vélez critica o que chama de ideologia de gênero nas escolas, que ensinam “menino a beijar menino e menina a beijar menina”. Questionado sobre a inexistência de evidências empíricas que sustentem tal tese, limitou-se a dizer que essa não é uma pauta que o interesse. “Mas se houver demanda da sociedade, vamos discutir”, diz. No ano passado, o projeto da Escola Sem Partido, principal síntese dessa linha de pensamento, foi engavetado em Comissão da Câmara. Não está descartada, porém, a volta de sua tramitação.
Vélez afirma que montou seu gabinete com “amigos de Londrina (Paraná)” e “aluninhos” da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), de onde vieram outros três secretários: Marco Antônio Barroso Faria, da Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior (Seres); Alexandro Ferreira de Souza, da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (Setec); e Bernardo Goytacazes de Araújo, da Secretaria de Modalidades Especiais. O terceiro núcleo é formado por egressos do Centro Paulo Souza, de São Paulo.
Nascido em Bogotá, na Colômbia, Vélez tem 75 anos e se naturalizou brasileiro em 1997. Graduou-se em filosofia e teologia na Colômbia. É mestre em filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e doutor na mesma área pela Universidade Gama Filho, também do Rio. É professor emérito da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme).
A prioridade dos cem primeiros dias no MEC será o programa Alfabetização Acima de Tudo, que será conduzido por Nadalim, cuja experiência anterior era como coordenador da escola de sua família em Londrina, o Mundo Balão Mágico. Ele possui um blog e canal no YouTube onde tece críticas contundentes a educadores de contribuição inquestionável, como Paulo Freire, pedagogo brasileiro mais reconhecido, e Magda Soares, professor emérita da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Nadalim é conhecido por defender o controverso método fônico, que relaciona letras a sons, em detrimento do construtivista. Apesar de suas posições pessoais, Nadalim garante que vai convocar uma conferência nacional para ouvir especialistas de todas as vertentes em alfabetização, em data a ser definida.
Vélez também é entusiasta das escolas cívico-militares, um projeto que, em sua avaliação, é viável economicamente. Sem detalhar como o programa será tocado, o ministro diz que as escolas que desejarem aderir manterão seus modelos pedagógicos. A diferença, diz, virá com o modelo de gestão que será trazido por militares. Segundo ele, exemplos já existentes mostram que basta “meia dúzia” de militares para que os traficantes parem de aliciar os jovens.
Do Valor