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Protestos em Wall Street questionam cinismo

Publicado em: 08/10/2011

 

Época- de Paulo Moreira Leite – A  economia mundial está despencando e tem gente que acha que o melhor a fazer é falar mal dos protestos de Wall Street.

Felizmente, nem todo mundo pensa assim.

Pertence a Michael Daly, do site The Daily Beast, um dos mais influentes dos EUA, uma observação que vem a calhar: enquanto a polícia prende manifestantes, os banqueiros permanecem soltos. Estamos tão habituados a determinadas contradições e injustiças que talvez seja ainda mais difícil  enxergá-las quando ficam escancaradas à nossa frente.

Há muito tempo somos habituados a intelectualizar artificialmente a realidade, enxergando complicações e complexidades que muitas vezes não passam de uma cortina de fumaça que só contribuem para nos tornar conformistas e até hipócritas.

Como ficou rigorosamente demonstrado pelo filme Inside Job, boa parte do sucesso e dos lucros do mercado financeiro nas últimas décadas foi obtida a partir de atos fraudulentos, imorais e criminosos.

Consumidores foram atraídos para hipotecas que se sabia que não poderiam pagar. Agencias de riscos deram certificados que eram típicos contos do vigário. Papeis foram vendidos, revendidos, trivendidos, tetravendidos e assim por diante, numa espiral fabricada para gerar riquezas artificais que criou a pior crise do capitalismo em 80 anos, gerou um desemprego recorde em várias partes do mundo, comprometeu o futuro de novas gerações e a esperança de milhões de famílias.  Quando o cassino privado quebrou, o conjunto da sociedade foi obrigado a socializar o prejuizo.

Perguntinha que não quer calar: alguém foi preso? Não.

Os responsáveis foram premiados. Ganharam premios milionárias e rapidamente voltaram a agir como antes.

Michael Daly observa que você pode quebrar a economia americana “e ninguém será preso. Mas tente bloquear o transito e você será levado para a cadeia,.” acrescenta, depois de entrevistar vários dos 700 ativistas que foram presos em Nova York depois de  ocupar a ponte do Brooklyn.

Enquanto isso, observa Daly, nada aconteceu com o Goldman Sachs, que vendeu US$ 250 milhões em hipotecas envenadas. Nem com a Fannie Mae, gigante de moradias que falsificou seus balanços em US$ 200 milhões e assim reforçou o bonus de seus dirigentes. Ninguém foi preso nem precisou devolver o dinheiro embolsado indevidamente.

É estudantil? É. Mas o mesmo raciocínio comove outras mentes, muito mais cultas do que eu e você. Com o conhecimento de quem acompanha a crise em seus detalhes, o Premio Nobel de Economia Paul Krugmann observa:

“alguma coisa está acontecendo. Ainda que não saibamos ao certo do que se trata, podemos, por fim, estar diante de um movimento popular que, ao contrário do
Tea Party, está zangado com as pessoas certas.”

Para Krugmann, “os  ataques  dos manifestantes a Wall Street como uma força destrutiva, em termos econômicos e políticos, estão completamente corretos.”

Ele explica:
“nosso debate político caiu vítima de um fatigado cinismo e de uma crença em que
justiça jamais será feita -e, sim, eu mesmo incorri nesse erro. Tornou-se fácil
esquecer até que ponto a história de nossos problemas econômicos é ultrajante. ”

Krugmann descreve o que acontece hoje na economia mundial de modo didático, em tres fases. Na primeira, os banqueiros aproveiram a desregulamentação da economia para operar sem controles, recebendo “remunerações principescas.” Na segunda, a crise estourou e eles foram salvos com dinheiro público. No terceiro ato, os banqueiros resolveram financiar o Tea Party, impedindo que os poderes públicos possam criar regras mais saudáveis para a economia.

“Dado esse histórico, como não aplaudir os manifestantes?”, pergunta o Premio Nobel.
“É verdade que alguns deles se vestem de modo esquisito ou entoam lemas tolos.
Mas e daí? A mim ofende mais ver plutocratas imaculadamente trajados (e que
devem a manutenção de suas riquezas a garantias do governo) queixando-se de
que Obama lhes fez referências desagradáveis do que ver jovens maltrapilhos
atacando o consumismo.”

Lembrando que o movimento pode crescer mais caso venha a assumir reivindicações claras e objetivas, Krugmann apoia a sugestão de que se deveria transformar o alívio das dívidas dos trabalhadores como a plataforma central dos protestos. “Endosso a ideia, que faria muito para ajudar a economia a se recuperar,” diz.

Segundo Krugmann, o”governo Obama desperdiçou grande parte da boa vontade do público ao adotar políticas simpáticas aos bancos e que não produziram recuperação. Agora, porém, os democratas têm a chance de recomeçar.”

Como? “Basta levar esses protestos tão a sério quanto eles merecem.”

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