“Depois do onze de setembro de 2001, nos Estados Unidos tudo poderia ser feito em nome do combate ao terrorismo; no Brasil, depois da espetacularização de denúncias de corrupção política motivada pela Operação Lava Jato, tudo passou a ser admitido em nome do combate à corrupção”.
A proposta do debate “A Influência do Ativismo na Produção de Informações e na Lógica Midiática” surgiu como forma de superar a dicotomia entre o jornalismo e o engajamento político. De um lado, o jornalismo, historicamente associado a valores que o afastam da tomada de posição, como caminho necessário para alcançar a verdade, em nome da neutralidade e do equilíbrio; do outro lado, práticas jornalísticas engajadas politicamente, associadas a um formato alternativo de mídia.
Esse tema foi amplamente analisado pela pesquisadora norte-americana Adrienne Russell (2016), em seu livro “Journalism as Activism: recording media power”. Na análise, Russell propõe uma reflexão sobre a forma como práticas jornalísticas têm se transformado ao incorporar valores que superam o mero ato de dar ‘os dois lados da história’. Para a jornalista Kamila Bossato Fernandes, mais do que defender um jornalismo ativista, a autora sugere “que se repense o jornalismo não como um modelo fechado, mas como uma prática imersa na disputa de poder, em que vozes antes invisibilizadas passaram a gerar influência, trazendo não só relatos ‘objetivos’, mas afetos e paixões por certas causas ‒ o que se dá pela presença, no ambiente digital, das sensibilidades hacker ativistas” ‒ e o jornalismo não teria como ficar fora disso”.
O jornalista Glenn Greenwald é um dos autores da vanguarda midiática citados por Russell por inovarem a produção jornalística e assumirem um papel ativista, especialmente, por ter trazido à tona documentos vazados por Edward Snowden sobre o sistema de vigilância global da NSA, a agência de segurança dos Estados Unidos. As reportagens deram a Greenwald o prêmio Pulitzer.
Por que a NSA estava espionando o mundo inteiro, inclusive o Brasil? Para dar vantagens aos Estados Unidos nas negociações com o G8, controlar a estatal de petróleo brasileira, e derrubar algum líder do 3º mundo que não quisesse cooperar, como foi o caso da ex-presidenta Dilma Rousseff, vítima de um golpe de estado em 2016. Snowden descobriu que a luta contra o terrorismo, depois do onze de setembro de 2001, foi uma criação da NSA para intervir na política internacional.
Se nos Estados Unidos tudo poderia ser feito em nome do combate ao terrorismo; no Brasil, depois da espetacularização de denúncias de corrupção política, motivada pela Operação Lava Jato, tudo passou a ser admitido em nome do combate à corrupção. Fundador do site The Intercept Brasil, Glenn Greenwald também foi o responsável por publicar as conversas vazadas do aplicativo Telegram entre o ex-juiz e ex-ministro da justiça do governo Bolsonaro, Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba. As mensagens deixaram clara a obsessão deles em incriminar e prender o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em ano eleitoral e eleger Bolsonaro, um dos projetos políticos mais antagonistas do Brasil.
Para Glenn, em entrevista a Gabriel Valery da RBA, “a grande mídia estava aliada com Moro nos últimos cinco anos. Não só pela ideologia, mas também porque o modelo de lucro da mídia brasileira era de receber vazamentos sem gastar nada, sem fazer investigação” e ampliar a audiência com os ‘espetáculos’.
Em nome da prestação de um serviço que consideravam mais relevante ao público, jornalistas como Greenwald, se envolveram com causas sociais, passaram a adotar novos formatos de apropriação, circulação da informação e contribuíram com as recentes transformações ocorridas no ambiente midiático.
As iniciativas, que nasceram com os protestos, como a veiculação em streaming das manifestações, começaram a influenciar as práticas jornalísticas. Os protestos sociais ganharam visibilidade ao redor do mundo, não apenas nas redes sociais, mas também nos meios de comunicação tradicionais. Para debater sobre essa e outras questões relacionadas a influência do ativismo na produção de informações e na lógica midiática foram convidados ativistas e jornalistas que atuam com o objetivo de contribuir com a realidade em que vivem, à medida que analisam, discutem, imprimem opinião, realizam e participam de manifestações democráticas.
São eles:
• Fabiano Leitão, músico, ativista político, é conhecido como o trompetista de Lula e por invadir vários links ao vivo da Globo com o jingle “Olê, olê, olê, olá. Lula lá, Lula lá”. A sua última intervenção espontânea em Salvador foi na Concha Acústica do TCA, no show de Gilberto Gil em 15 de dezembro de 2019.
• Gimênia Marx, historiadora, pedagoga e ativista política, é uma das criadoras do Coletivo de Ação Política Lula Livre (CALL);
• Messias Figueiredo, professor do Instituto Federal da Bahia (IFBA), ativista político, participou de mais de 300 ações em Salvador e em diversas cidades do interior, é o criador do “Nanotrio Lula Livre”, um dos principais instrumentos da luta política na Bahia, símbolo direto da resistência pela liberdade de Lula;
• Kátia Barbosa, pedagoga, professora do Departamento de Educação da UNEB, pesquisadora em Educação em Prisões, é uma das coordenadoras do projeto de extensão Leitura e Escrita: Ações Libertárias, que objetiva a remissão da pena, através da leitura;
• Onã Rudá, jornalista, articulador político, diretor da União Nacional LGBT Bahia, coordenador da área de esportes da Aliança Internacional LGBTQIA+, é o fundador da Torcida LGBTricolor e da torcida LGBT do Esporte Clube Bahia;
• Simone de Moraes, jornalista, articuladora política, é diretora executiva do site Câmara em Pauta/Brasília;
• Eduardo Machado, jornalista preto, articulador político, educador na Cipó Comunicação Interativa, Ogan no Ilê Axé Torrun Gunan, é integrante da Frente Nacional Makota Valdina e do Coletivo Incomode;
• Mary Weinstein, jornalista especializada em cidade e patrimônio cultural, atuou como repórter do Jornal A Tarde e da TV Bahia, é professora titular do Curso de Comunicação/Jornalismo da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB).
Os temas abordados serão referentes à prática jornalística-ativista, como as redes de distribuição do conteúdo informativo, as ferramentas utilizadas para produzir e compartilhar o conteúdo, exemplos de posicionamentos adotados pela indústria de Fake News, e, finalmente, uma discussão sobre como potencializar a difusão da comunicação social em prol da democracia. Cada debatedor responderá a duas perguntas e fará duas perguntas, sempre direcionado pelo mediador responsável. O jornalista Tiago Henrique, jornalista, diretor do Sinjorba e apresentador da TV UESB será o mediador dos jornalistas; Jailton Andrade, advogado e diretor do Sindicato dos Petroleiros da Bahia (Sindipetro) será o mediador dos ativistas.
Durante a apresentação, o público que vai assistir ao debate terá oportunidade para fazer perguntas aos convidados. Mas, apenas no final da apresentação, elas serão respondidas.
SERVIÇO
Jornalistas e ativistas discutem “A Influência do Ativismo na Produção de Informações e na Lógica Midiática”
QUEM:
Fabiano Leitão, Gimênia Marx, Messias Figueiredo, Kátia Barbosa, Jailton Andrade, Onã Rudá, Simone de Moraes, Eduardo Machado, Mary Weinstein e Tiago Henrique
QUANDO:
11 de setembro de 2020, sexta-feira, das 16h às 18h
ONDE:
Link do Google Meet e no Canal do You Tube do Sinjorba