As voltas que o mundo dá

Por Bernardo Assis Filho

Dizem que o mundo dá voltas, e que a história só se repete como farsa. Tivemos no século passado, quatro movimentos de extrema direita na Europa, que ficaram conhecidos como salazarismo em Portugal, franquismo na Espanha, fascismo na Itália e nazismo na Alemanha, todo da era “analógica”, digamos.

No século atual, tivemos seus sucedâneos : o trumpismo nos EEUU e o bolsonarismo no Brasil, este, filho dileto do anterior, mas ambos dessa nossa era digital, onde imperam as redes sociais, um espaço virtual sem fronteiras, onde operam as big tecs que comercializam nossos dados pessoais, continua e massivamente capturados por meio de suas plataformas, que submetidas a análise estatística com auxilio de algoritmos, permitem prever e induzir comportamentos coletivos.

Sob esse mundo digital, existe uma camada profunda conhecida por dark web ou deep web, de onde vêem as fakes news, e toda sorte de negócios ilícitos. Os defensores do trumpismo e bolsonarismo, alegam “liberdade de expressão” para legitimar essas práticas, como se mentir ou achacar de toda ordem, tivesse status de dignidade.

Portanto sob essa imensa população de algoritmizados, principalmente das camadas menos letradas ou iletradas do país, despeja-se diuturnamente uma profusão dessas fakes, que vem favorecendo o surgimento do que a neuro-ciência já vinha detectando, que é a dissonância cognitiva coletiva, onde as massas se aferram a falsas crenças, que vão, desde a legitimidade de atos anti-democráticos como pedido de intervenção militar, à sorrelfa da Constituição Federal, até atitudes como cantar o hino nacional para pneu, tentar barrar caminhão pendurando-se no seu painel, orar com as mãos espalmadas nos muros dos quartéis, esgares de ódio a surtos histeridiformes transitórios.

O que se vem pela frente, não sabemos, mas seguramente, como a saúde mental do brasileiro, já vinha afetada pela pandemia, com o surgimento de novos transtornos psíquicos, podemos prever o aumento significativo dessa demanda (depressões, transtornos neuróticos, alcoolismo e outras droga-adições) e as dificuldades que advirão aos setores assistenciais, em função do sucateamento do SUS que se registrou nos últimos anos.

Detalhe da foto: Um flagrante do mais recente exemplo de surto histeridiforme nos acampamentos dos inconformados com a vitória das forças democráticas no país:  sinais com a mão e celular na cabeça buscando contato com o “general” que vai trazer de volta a realidade paralela em que os manifestantes estavam acostumados a viver e ser alimentados diariamente através de redes de fake news. 

Bernardo Assis Filho é Psiquiatra