GDF diz que Lei anti-homofobia vale mesmo sem regulamentação. Será?

Publicado em: 11/05/2013

A polêmica está no ar, desde que o governo do Distrito Federal regulamentou nesta quinta (09) pela manhã e revogou à noite a Lei anti-homofobia alegando “erro administrativo” com relação ao Decreto nº 34.350, de 09 de maio, que regulamentava a lei 2.615/2000, que trata de sanções às práticas discriminatórias em razão da orientação sexual. O GDF garante que, mesmo não regulamentada, a lei está em vigor. A dúvida que fica é: será efetivamente aplicada? 

O fato causou a indignação do movimento de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Travestis (LGBT) e de defensores dos direitos humanos e para jogar panos quentes, o consultor jurídico do Distrito Federal, Paulo Guimarães, ao explicar as razões que teriam levado à revogação do decreto, disse que a análise do mérito da proposta está sendo feita para o aperfeiçoamento, mas que “a lei de 2000 está em vigor e em quaisquer ocorrências que envolvam qualquer cidadão em práticas discriminatórias está assegurado o direito de entrar com uma petição e levar o fato para conhecimento da Administração Pública para que a lei seja aplicada”.

 

Aplicabilidade – A pergunta de Câmara em Pauta é: leis sem regulamentação têm alguma possibilidade prática de validade, além de alguma espécie enviesada de trâmite que, ao fim e ao cabo, seja arquivado sem aplicação alguma? Juridicamente, embora sejam instrumentos legais, as normas não regulamentadas não têm dispositivos como prazos, exceções e sanções, o que inviabiliza ações de fiscalização punitiva. Em suma: as petições que porventura forem encaminhadas podem até ser analisadas, alguma sanção pode vir a ser recomendada, mas um recurso certamente irá argumentar que não há regulamento para aplicar a lei.

 

Segundo o jurista José Joaquim Gomes Canotilho, “o regulamento é uma norma emanada pela Administração no exercício da função administrativa e, regra geral, com caráter executivo e/ ou complementar da lei”. Já Eros Grau diz que a função normativa regulamentar “consubstancia permissão para o exercício”. Trocando em miúdos e explicando a grosso modo, o regulamento é o que faz a lei ter alguma possibilidade de ser executada.

 

Nota da redação – Depois de consultar alguns especialistas e de muito refletir, a nossa humilde e leiga opinião é que, da forma como está, na prática a lei anti-homofobia do DF inexiste, como vem sendo há quase 13 anos, desde que foi promulgada. Também ousamos dizer que as explicações de que há “absurdos” e que tais discrepâncias não foram percebidas nos últimos 12 anos, já que a lei foi promulgada em 2000. O mandato de Agnelo Queiroz está no terceiro ano e só agora, depois de regulamentar e publicar o decreto, a equipe se deu conta dos erros? Sendo assim, quanto tempo será necessário para dirimir tais erros?

 

Pelo sim, pelo não, esperamos estar enganados e enquanto a regulamentação efetiva para calibrar a balança da justiça não vem, leia abaixo a íntegra da entrevista de Paulo Guimarães à Agência Brasília.

 

Consultor jurídico explica revogação do decreto

 

BRASÍLIA (9/5/13) – O consultor jurídico do Distrito Federal, Paulo Guimarães, explicou em entrevista à AGÊNCIA BRASÍLIA as razões da revogação do decreto que regulamenta a Lei 2.615, de 2000, sobre as sanções a casos de discriminação contra pessoas em decorrência de sua orientação sexual.

 

PERGUNTA – Por que o decreto foi revogado?

 

Paulo Machado Guimarães – Porque o governador Agnelo Queiroz recebeu ponderações sobre problemas administrativos na tramitação das matérias. O decreto que regulamenta a Lei 2.615, de 2000, prevê a possibilidade de suspensão e até cassação de alvará de funcionamento, por exemplo. Esses atos são praticados pelos administradores regionais do DF e envolvem cada uma dessas autoridades. Portanto, a regulamentação prevê que a representação seria encaminhada para uma comissão especial de apuração, mas não se concebeu a participação das administrações regionais, que são as autoridades competentes para a prática do ato. Outro problema foi a aplicação de forma correta da Lei 9.784 de 1999, do Distrito Federal, que trata do processo administrativo e prevê a possibilidade de até três instâncias recursais, e na regulamentação posta pelo decreto só há previsão de uma instância, que iria diretamente ao governador. E isso também significa uma restrição a direitos legais, que estão assegurados há anos aos cidadãos, o que poderia ensejar questionamentos judiciais que, no entendimento do governador, seriam desnecessários neste momento.

 

P – A revogação ocorreu, então, por um problema administrativo?

 

Guimarães – Sim, o problema foi a tramitação desses processos, de ordem jurídica e administrativa interna na administração, e envolve atos de competência das administrações regionais. A rigor, o que o decreto traz efetivamente de novo é apenas a tramitação. A primeira parte do documento é a reprodução do que a lei de 2000 estabelece e, portanto, não tem novidade. A segunda é exatamente como essa matéria seria tramitada internamente e aí houve um problema. Portanto, não há nenhum prejuízo aos cidadãos em razão desses aspectos. O governador é enfático ao dizer que, no governo, o respeito aos direitos humanos é uma marca e um compromisso constitucional que ele insiste e se compromete de forma inarredável.

 

P – Qual a previsão para a análise ser concluída e o decreto, novamente publicado?

 

Guimarães – A orientação do governador Agnelo Queiroz é que esses estudos sejam feitos o mais rápido possível, e entre 30 e 60 dias acreditamos que teremos condições de concluir essa fase. Nesse período teremos oportunidade de ouvir os setores interessados, a área comercial, os segmentos sociais e administradores regionais, que poderão contribuir e apresentar sugestões de como melhorar a tramitação dessas matérias. O governador reforçou ainda que a lei está em vigor e que os direitos dos cidadãos previstos serão respeitados e não será admitida qualquer discriminação.

 

P – Como será feita a análise do decreto?

 

Guimarães – A análise é feita no mérito da proposta, com importante contribuição da Casa Civil e da Consultoria Jurídica. O governador recebeu ponderações que considerou relevantes e eu, como consultor jurídico, concordo plenamente que isso é necessário. Faremos uma revisão imediata em benefício de um aperfeiçoamento da tramitação. Tivemos a oportunidade de tranquilizar o governador de que a lei de 2000 está em vigor e em quaisquer ocorrências que envolvam qualquer cidadão em práticas discriminatórias está assegurado o direito de entrar com uma petição e levar o fato para conhecimento da Administração Pública para que a lei seja aplicada.

Artigos relacionados