A Câmara Legislativa do Distrito Federal continua o processo de apreciação do Plano de Preservação do Setor Urbanístico de Brasília (PPCUB), proposto pelo Executivo, a deespeito de todas as críticas e recomendações em contrário, vindas de órgãos como Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e a Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura (Unesco) e do movimento Urbanistas por Brasília, que no início do mês mandou carta alertando os distritais sobre problemas existentes no processo.
Nesta quinta (22), o tema voltou ao debate em audiência pública, encerrando a fase de discussão do tema, em evento promovido pela Comissão de Assuntos Fundiários (CAF) no auditório da Casa, reunindo especialistas, representantes de entidades da sociedade civil, autoridades, empresários e dezenas de moradores da área tombada, que compreende o Plano Piloto, Cruzeiro, Candangolândia, Sudoeste e Octogonal. Evidentemente que foram convidadas pessoas que são favoráveis ao projeto.
Seguindo o barco contra a corrente das críticas ao projeto, a partir da próxima semana serão realizados encontros temáticos para discutir o PPCUB, em audiências públicas conjuntas da CAF, Comissão de Desenvolvimento Econômico Sustentável, Ciência, Tecnologia, Meio Ambiente e Turismo, e Comissão de Constituição e Justiça. Os encontros na CLDF serão realizados, às 9h, nos dias 26 e 29 de novembro e 7 de dezembro. Nos dias 4 e 10 de dezembro, as audiências têm início às 19h.
Na Audiência, também estiveram representantes do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do DF (Crea-DF), do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Distrito Federal (CAU-DF) e da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação do GDF.
Reivindicações – Na reunião de hoje, coordenada pelo deputado Cláudio Abrantes (PPS), presidente da CAF, foram tratados temas como a situação das pousadas instaladas na W3 Sul; as chácaras da Vila Planalto; os "puxadinhos" das quadras comerciais nas Asas Sul e Norte; o cercamento de residências no Cruzeiro; o Setor Hoteleiro; e os problemas do trânsito na área central da cidade, entre outros. Problemas polêmicos, como a expansão do setor Hoteleiro Norte ficaram de fora.
Abrantes reiterou a responsabilidade da CLDF ao votar a proposta. Segundo ele, todos os setores defendem a preservação do plano original de Brasília e por conta disto, os interessados a participar das próximas reuniões temáticas foram convidados. Câmara em Pauta ressalta aqui que é importante que os contrários à proposta sejam ouvidos oficialmente.
Críticas – O PPCUB que está em tramitação já foi condenado pela Unesco e Iphan, que se pronunciaram oficialmente contra a aprovação do PPCUB como está. Câmara em Pauta já comentou, por mais de uma vez, a “ideia fixa” e os “ouvidos de mercador” do governador Agnelo Queiroz (PT) e do Secretáriosde Desenvolvimento Urbano e Habitação, Geraldo Magela quanto às posições oficiais dos órgãos e aos apelos dos Urbanistas.
Mesmo assim, sem nenhuma recomendação ter sido seguida, o PPCUB foi aprovado no dia 04 de outubro pelo Conselho de Planejamento Territorial e Urbano do Distrito Federal (Conplan) e dá os últimos passos para determinar as regras de uso e ocupação do solo na capital federal e deverá prever, regular e qualificar, por exemplo, áreas de comércio e serviços, áreas verdes, parques urbanos e habitação diversificada, e vale inclusive para o conjunto urbano tombado — Plano Piloto, Candangolândia, Cruzeiro e Sudoeste/Áreas Octogonais.
Reiterando que, tanto o Iphan quanto a Unesco fizeram críticas importantes ao conteúdo e metodologia do PPCUB que, caso integralmente acatadas, levariam à paralisação do processo e revisão do documento. Replicamos novamente a carta aberta à CLDF feita pelo movimento “Urbanistas por Brasília”, alertando que o PPCUB não pode ser aprovado como está, mas não podemos deixar de criticar a postura da CLDF que, salvo raras exceções, não tem se importado muito em prestar contas de seus atos à sociedade e agem como se representassem os próprios interesses e não os do povo.
CARTA ABERTA AOS DEPUTADOS DISTRITAIS
"Senhor(a) Deputado(a) Distrital,
O Projeto de Lei Complementar 052/2012 dispõe sobre a aprovação do Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB), o qual será o instrumento central da política de preservação, planejamento e gestão do Conjunto Urbanístico de Brasília. Sua análise e aprovação pela CLDF representam uma grande responsabilidade que não deve se submeter a urgências outras que não seja a de preservar a cidade.
O PPCUB deveria ter o objetivo de aperfeiçoar as normas que regem a ocupação de Brasília, reforçando e protegendo os conceitos e valores reconhecidos pelo tombamento. Entretanto não é isso que se tem percebido no conteúdo do documento: não há transparência quanto às alterações que estão sendo propostas para a área tombada, há pouca referência aos conceitos estabelecidos pela legislação de proteção (Decreto 10.829/87 e Portaria IPHAN 314/92), há severas críticas feitas por instâncias como UNESCO e IPHAN que estão sendo desconsideradas e há a insistência no projeto hoteleiro para a quadra 901 Norte, rejeitado por diversos setores da sociedade. Em suma, o PPCUB não está em condições de ser analisado e aprovado nesse momento pela CLDF.
Dentre as 38 Recomendações da Missão UNESCO/ICOMOS (março de 2012) que devem ser atendidas pelo Governo do Distrito Federal é fundamental destacar as que tratam diretamente do PPCUB:
"36. (O GDF deve) Cancelar o processo de aprovação atual do PPCUB e estabelecer um processo formal de consulta através de uma comissão constituída pelo GDF e IPHAN, possibilitando a participação ativa por parte da Universidade de Brasília, da Associação de Arquitetos, ICOMOS Brasília e organizações pertencentes à comunidade. Os resultados serão submetidos ao Comitê do Patrimônio Mundial para avaliação;
37. Fazer uma revisão (do PPCUB) seguindo como orientação fundamental a proposta feita por Lúcio Costa para o Plano Piloto, conforme expresso em seu Relatório para a concorrência e no documento Brasília Revisitada."
Além das recomendações da Missão UNESCO 2012, a Presidência Nacional do IPHAN também se manifestou em relação ao PPCUB por ocasião da avaliação do documento no CONPLAN, recomendando importantes ajustes de conteúdo por meio do Ofício nº 851/2012, entre os quais:
relacionar o Plano de Preservação aos valores atribuídos ao Conjunto Urbanístico de Brasília pelo tombamento e inscrição na Lista do Patrimônio Mundial, explicitando de forma clara as definições conceituais que orientam a leitura da cidade a partir de seus princípios fundamentais, ou seja, o entendimento das escalas (em seus princípios e localização), além dos componentes físicos do sítio como território, estrutura viária, integridade e estado de conservação, entre outros;
definir os critérios e valores que sustentam as alterações funcionais e de regras de uso e ocupação do solo, referenciados aos “problemas” e “desafios”, bem como ao enquadramento no âmbito dos valores e objetivos do Plano de Preservação;
revisar os textos, visto que contêm inúmeras falhas – incongruências, conflitos de enunciados, erros de digitação e comentários contraditórios.”
A imprensa especializada tem acompanhado com atenção o processo de elaboração do PPCUB, se atendo principalmente à polêmica do projeto hoteleiro para a quadra 901 Norte. Esse projeto também foi criticado pela Missão Unesco 2012 e IPHAN, além do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), UnB, comunidade acadêmica e MPDFT. Arquitetos da cidade se uniram por meio do movimento Urbanistas por Brasília em 2011 e divulgaram Manifesto com quase 140 assinaturas de profissionais contrários à implantação de hotéis na 901 Norte. A população também tem se manifestado fortemente contra o projeto hoteleiro para a quadra 901 Norte por meio de uma Petição Pública (http://www.peticaopublica.com.br/?pi=P2011N15792) com quase 1230 adesões até o momento.
Ainda assim o Governo do Distrito Federal insistiu nesse projeto na apreciação do PPCUB pelo CONPLAN, em 4/10/2012. No citado Ofício nº 851/2012, a Presidência do IPHAN se posicionou definitivamente em relação à incompatibilidade desse projeto com a preservação de Brasília, encerrando a discussão sobre os parâmetros aplicáveis à Quadra 901 Norte, conforme segue:
"Por fim entendemos que, até o presente momento, estão mantidos os usos, normas e gabaritos estabelecidos para os Setores de Grandes Áreas pela NGB 01/86 (parâmetros também incorporados à legislação de tombamento de Brasília).
Desta forma, no caso da aprovação do Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB), o que implicará na automática revogação das NGB em vigor (art. 220), o IPHAN deverá considerar os seguintes parâmetros de ocupação do lote, a saber:
uso institucional;
pavimentos permitidos e altura máxima: três pavimentos e 9,50m
(…)
Diante do exposto, o IPHAN não concorda com os índices indicados na Minuta do Projeto de Lei Complementar (PLC) do Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB) e recomenda a não criação da UP4 da AP6 – Setor de Grandes Áreas Norte – Quadra 901 Norte, conforme proposto nos artigos 46, 47, 108 e 109, uma vez que tais artigos encontram-se em flagrante desacordo com o art. 11 da Portaria 314/1992 e art. 17 do Decreto-Lei 25/1937.”
Apesar da manifestação conclusiva do IPHAN, o GDF encaminhou o PLC 052/2012 para apreciação da CLDF insistindo mais uma vez no projeto hoteleiro da Quadra 901 Norte. Assim, foram mantidos os artigos 45 (§2º, IV), 107 e 108, além da PURP 29 (Anexo 4 – Planilha de Parâmetros Urbanísticos e de Preservação), de forma a garantir a criação da UP4 da AP6, bem como a discussão de novos parâmetros para a área em até 180 dias. Parâmetros esses já definidos pelo IPHAN. O Governo do Distrito Federal ignora tanto a recomendação da maior instância de proteção ao Patrimônio Histórico do Estado Brasileiro quanto a recomendação da Missão Internacional da UNESCO, tudo em nome de um projeto urbanístico com objetivos meramente comerciais, bem como induz ao cometimento de ilegalidade na eventual aprovação do PPCUB pela CLDF.
Em síntese, o PPCUB possui problemas conceituais, propõe significativas alterações de usos, gabaritos e coeficientes de aproveitamento, desmembramentos e criação de lotes, revelando o objetivo de intensificar a ocupação da área tombada. Culminando todas as alterações, o PPCUB propõe no artigo 219 a revogação do Decreto 10.829/87 em flagrante desrespeito à legislação de proteção e aos compromissos assumidos pelo governo brasileiro para a inscrição do Conjunto Urbanístico de Brasília na Lista do Patrimônio Cultural da UNESCO. Nesse sentido também, o PPCUB representa uma afronta às determinações da Lei Orgânica do Distrito Federal.
Diante do exposto, solicitamos aos Excelentíssimos Senhores Deputados Distritais que o Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico seja devolvido ao Poder Executivo de forma que as impropriedades, lacunas e falhas apontadas principalmente pela Unesco e pelo IPHAN sejam corrigidas, com ênfase especial para o afastamento em definitivo da proposta de alteração funcional e de verticalização da quadra 901 Norte.
Respeitosamente, Urbanistas por Brasília.