Com a concessão à iniciativa privada do Parque Nacional de Brasília, mais conhecido como Água Mineral, o preço do ingresso vai aumentar? Como será a gestão da área de conservação? E a preservação da área ambiental? Esses foram alguns questionamentos levantados durante audiência pública remota nesta quinta-feira (24), realizada pela Frente Parlamentar Ambientalista da Câmara Legislativa do Distrito Federal. A discussão foi transmitida, ao vivo, pela TV Web CLDF e pelo portal e-Democracia.
O pontapé inicial para a privatização do parque foi dado em 10 de agosto, por meio de decreto do presidente Jair Bolsonaro. Hoje, a administração da unidade de conservação está nas mãos do Instituto Chico Mendes (ICMBio). “Apesar de o processo se realizar no âmbito federal, nós, como representantes do Distrito Federal, devemos discutir e acompanhar, pois o tema é relevante para toda a sociedade do DF”, apontou Leandro Grass (Rede), presidente da frente parlamentar.
A deputada Arlete Sampaio (PT) lembrou que o Parque Nacional de Brasília, criado em 1961, tem muita importância para a toda a população: “Além da afetividade com esse espaço de lazer, há o aspecto ambiental: Brasília tem uma fragilidade hídrica enorme, e o parque é importante para a preservação de mananciais”. A distrital destacou, ainda, a dimensão histórica da área: “Em seu interior, temos trechos da antiga ‘estrada real’, do século XVIII, e também da Missão Cruls”.
Por esses e outros aspectos, a notícia da privatização da unidade de conservação gerou muita apreensão entre ambientalistas, frequentadores e representantes da sociedade civil organizada. Para Robson Eleutério, do Ecomuseu Pedra Fundamental, qualquer concessão para a iniciativa privada vai “elitizar” o acesso. “As populações mais pobres vão ficar excluídas”, avalia. Citando caso semelhante do Parque de Foz do Iguaçu, administrado por empresa privada, o professor afirmou: “Lá, R$ 200 por dia é pouco”. Perguntas sobre preço dos ingressos foram feitas por diversos participantes do chat da TV Web, no YouTube.
A presidente da Associação dos Amigos do Parque Nacional de Brasília, Junia Lara, também se disse preocupada com a “elitização” do acesso à Água Mineral, hoje uma opção ainda acessível à maioria das pessoas. Além disso, ela apresentou receio com relação à preservação da unidade ambiental: “A insegurança hídrica do DF é grande para entregar o parque para uma empresa. O Cerrado está morrendo e precisa ser protegido com unhas e dentes, é o berço das águas até para a Amazônia”. E completou: “Precisamos pensar alternativas para além de entregar o parque para uma empresa privada por 15 anos, prorrogáveis por mais 15”.
“Deveríamos estar discutindo a ampliação do parque, isso sim. O parque não é só a piscina. O mais importante é o bioma, a fauna e a flora, que precisam ser preservados. Quem está pensando em pegar a privatização está pensando em dinheiro, e não em preservação”, afirmou o deputado Chico Vigilante (PT).
Por sua vez, Cesar Vitor, do Fórum de ONGs Ambientalistas do DF, defendeu que serviços como de vigilância e de venda de alimentos podem ser entregues à iniciativa privada, mas que a proteção do patrimônio natural deve ficar a cargo do governo. “Isso é incumbência do Poder Público. O ICMBio tem fiscais capacitados e tem de ser fortalecido”, argumentou.
O que diz o governo federal
Presente à audiência pública, a secretária especial da Secretaria do Programa de Parcerias de Investimentos, Martha Seillier, explicou que o processo de concessão do Parque Nacional de Brasília está em seus primeiros passos: “O decreto do presidente foi apenas a autorização para iniciar o processo. Estamos iniciando a contratação de estudos de viabilidade técnica e ambiental”. A representante do governo federal garantiu que haverá espaço para ouvir a população e que todo o processo deverá levar cerca de um ano e meio.
Seillier fez questão, ainda, de diferenciar os termos “privatização” e “concessão”. “Neste caso, o patrimônio continua sendo público, há reversão das benfeitorias ao final da concessão, e há fiscalização do cumprimento do contrato. É uma parceria do governo com uma empresa privada”, explicou.
Para a deputada federal Erika Kokay (PT/DF), contudo, os dois conceitos – privatização e concessão – têm em comum “a assunção por uma entidade privada com a perspectiva de lucro”. Em sua opinião, o governo deveria ter discutido a ideia com a população do DF, antes de tomar uma decisão. “Estamos falando de algo que faz parte do imaginário de Brasília. Queremos que o governo suste essa proposição, essa decisão; e estabeleça uma discussão, pontuando os problemas sem partir do pressuposto de que a concessão é a solução. Não se mexe num patrimônio sem ouvir a população”, defendeu. Kokay informou que já foi apresentado um projeto de decreto legislativo (PDL) para sustar os efeitos do decreto presidencial e que a bancada distrital na Câmara dos Deputados pediu reunião com dirigentes do ICMBio para tratar do assunto.
Denise Caputo