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Reinaldo Azevedo chama Dallagnol de “blogueirinha malcriada” flagrada no “empregocídio” .

Publicado em: 17/12/2019

Sabem o que mais me incomoda no fato de procuradores da Lava Jato — seguindo o modelo habitual das blogueirinhas e candidatos a youtubers — recorrerem às redes sociais para criticar a entrevista concedida por Dias Toffoli, presidente do Supremo, ao Estadão? A falsa burrice, a demagogia barata (na verdade, muito cara!), a manipulação descarada da ignorância dos que se pretendem moralistas e letrados. E, por óbvio, os que mais se destacaram no gênero “blogueirinha bocuda” foram
Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa, e seu parceirinho, Roberson Pozzobon.
O conteúdo da entrevista foi ignorado. A íntegra está aqui. Há ali outras coisas com as quais concordo integralmente; com outras, nem tanto. Mas o que ele afirmou sobre a Lava Jato é absolutamente incontroverso. Até porque está no âmbito de uma medida tomada pelo ministro que há de ser o embrião de uma necessária mudança da legislação. Vamos recuperar o que disse Toffoli:
“A Lava Jato foi muito importante, desvendou casos de corrupção, colocou pessoas na cadeia, colocou o Brasil numa outra dimensão do ponto de vista do combate à corrupção, não há dúvida. Mas destruiu empresas. Isso jamais aconteceria nos Estados Unidos. Jamais aconteceu na Alemanha. Nos Estados Unidos, tem empresário com prisão perpétua, porque lá é possível, mas a empresa dele sobreviveu. A nossa legislação funcionou bem para a colaboração premiada da pessoa física. Mas a da pessoa jurídica não ficou clara. Então nós criamos um comitê interinstitucional para dar uma solução para esse problema. Muitas vezes o Judiciário pode ter essa função extrajudicial. Pela respeitabilidade, pode ser um árbitro para proposições e solução de problemas.”
Observem que nem se trata de uma crítica à operação — e há muito a ser criticado —, mas à legislação. Ao se referir ao trabalho em si, o ministro foi até elogioso. Mas, é fato incontroverso, empresas quebraram às pencas. O grupo Odebrecht, por exemplo, emprega um quarto do que empregava antes e está em recuperação judicial. Outros quebraram.
A Lava Jato pode não ter atuado com o intuito de destruir empresas, mas destruiu. E as foi enfraquecendo antes mesmo de as investigações chegarem a uma conclusão porque vazamentos criminosos, nunca investigados, iam minando a credibilidade de entes que empregavam milhares de trabalhadores.
As respostas bucéfalas dadas por Dallagnol e Pozzobon ignoraram o que disse o ministro com todas as letras. Reproduzo mais um trecho da fala de Toffoli: “Agora mesmo fizemos uma reunião extremamente importante a respeito do acordo de leniência [com as empresas processadas na operação Lava Jato]. Porque a Advocacia Geral da União entende de um jeito, o TCU de outro, o Cade de outro, o CVM, de outro, o MP de outro. Cada um acha que os acordos realizados têm que ter mais algum coisa. Quem é que pode arbitrar? Eu chamei uma reunião aqui. Já criamos um grupo de trabalho, um comitê executivo, para criar e ter uma solução efetiva até o final de março, para dar segurança jurídica.”.
Eis aí o problema. Esse é o debate de fundo que as duas blogueirinhas barbadas fingem ignorar, atraindo o apoio dos idiotas. Pouca gente se lembra que a Lei Anticorrupção, a 12.846, atribui à CGU (Controladoria Geral da União) a competência para celebrar acordos de leniência. O que fez o MPF, por meio da Lava Jato, foi sequestrar para si a prerrogativa.
Reproduzo trecho do livro “Leniência”, dos advogados Walfrido Warde e Valdir Moysés Simão: “O MPF chamou para si todos os acordos de leniência, arrogou-se competência exclusiva para celebrar todos os acordos de leniência da Lava Jato. E o fez com tanta convicção e a despeito da competência que a Lei Anticorrupção atribuía à CGU que criou mesmo uma central de colaborações (delações) premiadas e de leniência (a 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público) (…).
São emblemáticas as situações de impasse em que se inseriam empresas, cujos administradores ou controladores celebraram colaboração premiada e que, em razão de algum desalinhamento, tiveram sua pretensão à leniência descartada”.
Isso quer dizer seguinte, leitor: a lei nem atribui ao MPF a competência para fazer a leniência, mas ele chamou a coisa para si. Não ficou só nisso: passou a haver um “combo”, em que a leniência só se tornava possível se, na esfera penal, o delator, afinal, se comportasse de acordo com as vontades soberanas dos senhores procuradores.
Ocorre que nem por isso os demais entes perdiam as suas funções: CVM, Cade, TCU, Banco Central.
Saibam os leitores: empresas celebram acordos com o MPF, certo? Para que possam contratar serviços com a União, precisam do aval da CGU. Caso haja alguma questão relacionada à concorrência, têm de se entender com o Cade. Se houver infração à regulação de mercado, aí é com a CVM. Em havendo alguma instituição financeira no rolo, há o Banco Central. E cabe, finalmente, ao TCU zelar pela correção dos acordos. Resultado: desastre e quebradeira.
A isso se referia o ministro Dias Toffoli ao afirmar que a Lava Jato quebrou empresas. E quebrou. Essa é a questão que ele tenta equacionar quando sugere que se crie, segundo entendo, uma espécie de Câmara desses órgãos federais que apliquem, então, a sanção à empresa, de modo a ressarcir a sociedade pelo dano, mas sem quebrar o ente gerador de empregos, aquilo que, mesmo privado, é de interesse público. É evidente que é preciso descolar a delação dos “donos” — a esfera penal — dos acordos de leniência.
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