Gilmar ao dar mais 4 Habeas Corpus: Juiz não pode ceder a pressões de procuradores

Publicado em: 20/08/2017

“Não pode o juiz ceder à pressão de um grupo de trêfegos e barulhentos procuradores, nem se curvar ao clamor popular, pois a prisão no curso de processos só se justifica em casos excepcionais, devidamente fundamentados”.

Com essa crítica às prisões preventivas decretadas pelo juiz da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, Marcelo Bretas, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, concedeu Habeas Corpus a quatro envolvidos em supostos esquemas de corrupção no sistema de transporte público do Rio de Janeiro, que estavam detidos desde 2 de julho. São eles: Cláudio Sá Garcia de Freitas, Marcelo Traça Gonçalves, Enéas da Silva Bueno e Octacílio de Almeida Monteiro.

Gilmar acolheu os pedidos das defesas para extensão da decisão liminar que havia posto em liberdade os empresários Jacob Barata Filho e Lélis Teixeira, investigados na mesma operação, a ponto final, um desdobramento da “lava jato”.

Na atual conjuntura, “de abusos relativos a decretações de prisões desnecessárias”, a prisão provisória “continua a ser encarada como a única medida eficaz de resguardar o processo penal”, criticou Gilmar. “Mas esse abuso não pode mais ser admitido! Como dizia Rui Barbosa, ‘o bom ladrão salvou-se, mas não há salvação para o juiz covarde’”, escreveu o magistrado.

Para o ministro, a Justiça deve coibir os abusos. “É preciso que o Judiciário assuma, com responsabilidade, o papel de órgão de controle dos pedidos do Ministério Público, em vez de se transformar em mero homologador dos requerimentos que lhe são encaminhados”, argumentou.

O tom incisivo do ministro é uma resposta ao juiz Marcelo Bretas, que, na última quinta-feira (17/8), expediu novos mandados de prisão contra Jacob e Lélis horas após Gilmar conceder HC aos dois, o que impediu ambos de deixarem a prisão naquele dia. Na sexta-feira, porém, Gilmar deu duas decisões anulando os despachos de Bretas, o que garantiu a liberdade dos empresários.

No sistema institucional brasileiro, é o juiz quem decide sobre prisão, não o MP nem a polícia, apontou. Segundo ele, nos quatro casos estão presentes as situações que permitem o afastamento da incidência da Súmula 691 do STF, que determina: não compete ao Supremo conhecer de Habeas Corpus impetrado contra decisão do relator que, em HC requerido a tribunal superior, indefere a liminar.

De acordo com Gilmar, a súmula tem sido usada como subterfúgio para evitar o enfrentamento de questões realmente relevantes. “Reitero inicialmente minha posição quanto à aplicação da Súmula 691, que vem sendo iterativamente utilizada nas várias instâncias como valhacouto de covardes, para deixar de conhecer de casos gravíssimos que chegam pela via do HC.”

Os HCs de Lelis e Jacob foram impetrados no STF contra decisão da ministra Maria Thereza de Assis Moura, do Superior Tribunal de Justiça, que havia indeferido os pleitos das defesas.

Na decisão, Gilmar lembrou que a liberdade é a regra no processo penal e substituiu as prisões preventivas por medidas cautelares. Os quatro estão proibidos de sair do país e de manter contato com outros investigados, além de estarem suspensos do exercício de cargos na administração de sociedades e associações ligadas ao transporte coletivo de passageiros, entre outras restrições.

O ministro da Suprema Corte ressaltou que não desconhece a gravidade dos supostos crimes, mas entendeu que o perigo que a liberdade dos investigados representa à instrução criminal pode ser mitigado por medidas cautelares menos gravosas do que a prisão.

 

 é repórter da revista Consultor Jurídico.

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