Papéis obtidos pela Procuradoria Geral da República (PGR) mostram que o patrimônio do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), era 37 vezes maior do que sua última declaração à Justiça Eleitoral. Entre 2007 e 2008, ele juntou declaração de “aproximadamente 16 milhões de dólares” (R$ 61,5 milhões) para abrir contas no banco Julius Baer, na Suíça, informou o Ministério Público nesta sexta-feira (16/10). No entanto, Cunha disse à Justiça Eleitoral no ano passado que seu patrimônio somava apenas R$ 1,6 milhão, tudo no Brasil. Ou seja, em 2008, os bens do deputado seriam 37 vezes maiores do que declarado no ano passado.
As informações constam em documentos usados para embasar abertura de novo inquérito contra o presidente da Câmara por corrupção e lavagem de dinheiro. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki autorizou o início da nova investigação ontem à noite.
Em 2006, na última eleição antes de apresentar a declaração de US$ 16 milhões ao banco, Cunha disse à Justiça ter um patrimônio menor ainda: R$ 989 mil. Em 2002, afirmou ter bens que somavam R$ 525 mil.
Cunha nega a existência das contas bancárias e diz que, agora com o novo inquérito, poderá saber do que é acusado. “Não vejo isso como um problema; pelo contrário, vejo como solução”, disse ele ontem à noite. “É bom que tenha um instrumento para que a gente possa ter ciência e se defender.”
Segundo o procurador geral em exercício, Eugênio Aragão, há provas fortes de que as contas são de Cunha. “Há cópias de passaportes – inclusive diplomáticos – do casal, endereço residencial, números de telefones do Congresso Nacional e do Palácio do Planalto”, disse ele, por meio de comunicado da PGR hoje. Seu patrimônio estimado, à época da abertura da conta, era de “aproximadamente 16 milhões de dólares”. Ele entende que as contas não foram declaradas e, ao menos em relação a Eduardo Cunha, são produto de crime.
Campo de petróleo
Em 2011, a Petrobras pagou US$ 34,5 milhões pelos direitos de exploração de metade de um campo de petróleo em Benin, na África. Quebras de sigilo bancário do mostram que a empresa que recebeu o dinheiro pagou US$ 10 milhões ao lobista João Augusto Henriques mostra, que, por sua vez, repassou 1,3 milhão de francos suíços para uma conta na Suíça de uma offshore de Eduardo Cunha. Em depoimento, Henriques disse que eram comissões lícitas pelo negócio em Benin. A Procuradoria suspeita de mais propina para o deputado – que já é alvo de outra denúncia por corrupção envolvendo navios-sondas contratados pela estatal brasileira.
A papelada entregue ontem pelo procurador geral da República em exercício, Eugênio Aragão, tem 709 folhas, divididas em três volumes. Nelas, ele argumenta a necessidade de abrir a investigação com base em documentos enviados pelo Ministério Público da Suíça, que transferiu para o Brasil a apuração contra o deputado por corrupção e lavagem de dinheiro.
Nelas, há a indicação de três contas no banco Julius Baer em nome de offshores de Cunha e uma em nome da mulher, Cláudia Cruz. No entanto, o deputado nega a existência de qualquer conta no exterior ou de recursos além do que declarou às autoridades brasileiras. Ontem, ele disse que, com os papéis no STF, poderá ter do que se defender.
De acordo com dados do Ministério Público da Confederação (MPC), na Suíça, a conta da offshore Orion SP, de número 4548.1602, foi aberta em 20 de junho de 2008 e encerrada em 23 de abril do ano passado, um mês depois de a Lava-Jato estourar. Ela tem Cunha como beneficiário econômico. Foi lá que, entre maio e junho de 2011, o lobista José Augusto Henriques depositou o equivalente a R$ 5,24 milhões na cotação de ontem. Ele afirmou à Polícia Federal que repassou o dinheiro ao deputado a pedido de Felipe Diniz, filho do falecido deputado do PMDB de Minas Gerais Fernando Diniz. Henriques disse que se tratava de comissão lícita pelo negócio do campo de petróleo no Benin.
A conta de número 4548.6752, da Netherton Investiments, offshore sediada em Cingapura, foi aberta por Cunha em 29 de setembro de 2008. Lá, a Suíça confiscou 2,3 milhões de francos suíços em abril deste ano. Na conta Kopek, de Cláudia Cunha (4547.8512), foram congelados mais 146 mil francos. A conta Triumph SP (4546.6857) foi aberta pelo parlamentar em 3 de maio de 2007, e foi encerrada por Cunha em 20 de maio do ano passado, dois meses depois da Lava-Jato ser deflagrada.
No Brasil
Cunha nega possuir qualquer dinheiro fora do país. “Tudo o que eu tenho está no meu imposto de renda, declarado à Justiça Eleitoral, não sou sócio de nenhuma offshore, não mantenho conta no exterior de nenhuma natureza”, afirmou ele ao Correio em 12 de março, depois de declaração semelhante à CPI da Petrobras. À Justiça Eleitoral, ele declarou patrimônio de R$ 1,6 milhão no ano passado, tudo no Brasil.
Ontem, ele ironizou o fato de o Ministério Público também fazer um acréscimo à denúncia apresentada ao Supremo. “Se você esta fazendo o aditamento da denúncia hoje, significava que 60 dias atrás não era maduro fazer uma denúncia”, disse Cunha. Ele também comentou o surgimento de novas notícias negativas sobre ele às vésperas de um final de semana. “Quinta-feira já é o dia normal de sempre ter um dia de coisa divulgada em relação a mim. Quinta ou sexta eu espero. Vamos ver o que vai ser na semana que vem. Já estamos habituados.”
Fonte: Correio Braziliense