R7DF – Deixar a vida de casa, a comida e o conforto da família para se arriscar a viver sozinho em outro país para estudar ou trabalhar não é uma decisão tão simples. Sem organização, planejamento e pesquisas detalhadas sobre a agência a ser contratada, o intercâmbio pode se tornar em pesadelo. A Belta (Brazilian Educational and Language Association), associação que reúne mais de 90% das empresas do setor no Brasil, alerta que é preciso muito cuidado, pois existem falsas agências que iludem as pessoas, na maioria jovens (com idades entre 18 e 30 anos), para transformá-los em "cobaias do sexo", termo usado em países como Austrália, Nova Zelândia e Estados Unidos.
Este é o caso do estudante Felipe Lima dos Santos, de 25 anos. Formado em Biologia pela UnB (Universidade de Brasília), o jovem planejou durante dois anos um intercâmbio na Austrália para aperfeiçoar o inglês. Ao sair do Brasil, no entanto, a situação foi diferente.
— Em Brasília, na hora de contratar, é tudo lindo e maravilhoso. A agência exibe fotos, mostra relatos bonitos e promete "mundos e fundos". A gente se encanta com a proposta e acredita que será o melhor negócio da vida, mas não é assim que as coisas funcionam. Quando saímos do Brasil, eles nos obrigam a trabalhar para as "agências do sexo" em outros países e nos tornam cobaias dessa profissão.
O estudante afirma que mesmo pesquisando, às vezes as pessoas podem cair no golpe dessas "agências picaretas" atraídas pelas ofertas de mais vantagens e preços melhores.
— Este foi o meu caso. E, lá fora, quem não quiser se prostituir, é torturado até mudar de ideia.
Ele informou que, durante oito meses, foi obrigado a trabalhar com sexo e, nesse período, falou poucas vezes com a família. Em um desses contatos, os pais desconfiaram e decidiram investigar melhor a situação.
— A partir daí, eles [os pais] começaram uma investigação por conta própria, descobriram todo o podre por baixo dos panos e conseguiram me trazer de volta, mas preferimos deixar isso de lado para não correr novos riscos.
Santos afirmou que os contatos com a família eram sempre monitorados pelos aliciadores e ocorriam por telefone, no máximo, duas vezes ao mês.
— A família desconfiaria de qualquer jeito, porque eu não mantinha outro tipo de contato que não fosse exclusivamente por telefone e somente nessas ocasiões. Eu ficava quase que totalmente isolado do mundo, sendo obrigado a me prostituir dia e noite para eles. Como pagamento, eu recebia comida, roupa lavada, bebida e banho, nada além disso.
A pior experiência da vida
A situação não é diferente para Raphaelle Barros, de 23 anos. A jovem estudante de psicologia não tem família no DF e pesquisou durante três anos diversos programas oferecidos pelas agências da capital federal. Neste período, ela também conseguiu juntar o dinheiro necessário para ir estudar no exterior, mas disse que viveu "a pior experiência da vida".
— Passei pela pior experiência da minha vida em 2010. Pesquisei muito, fiz todos os procedimentos corretos, mas deu tudo errado. Me levaram para o México e depois para os Estados Unidos, e fui obrigada a ser "cobaia do sexo" durante meses. Eles usam esse termo porque se a pessoa não "servir" de jeito nenhum em um ano, é descartada como se fosse lixo.
A moça explicou que por não ceder às torturas e exigências para se prostituir, foi jogada na rua sem dinheiro e documentos após um ano.
— Ao invés de lucros, dei prejuízo para eles. Foi outra luta para voltar e não corro esse risco [de tentar um novo intercâmbio] nunca mais.
Os dois jovens contaram que chegaram a relatar os casos à polícia, mas afirmaram que as empresas funcionam com nomes fantasmas e os trocam constantemente para driblar a fiscalização e fugir das investigações policiais, razões pelas quais até o momento ninguém foi preso.
É preciso denunciar
A gerência do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas da Sejus-DF (Secretaria de Justiça do DF) informou que em 2011 uma parceria foi firmada entre o GDF (Governo do Distrito Federal) e a SNJ (Secretaria Nacional de Justiça), vinculada ao Ministério da Justiça, para combater e previnir esse tipo de prática na capital federal e no restante do País.
No entanto, a secretaria pede para que as vítimas e a própria população façam as denúncias, uma vez que são poucos os casos que chegam ao conhecimento das autoridades competentes porque, normalmente, as pessoas sofrem chantagens ou têm medo de passar por algum tipo de retaliação, fazendo-as desistir do procedimento [de denunciar].
A secretaria explicou que conta com uma equipe de assistentes sociais, psicólogos e profissionais com formação jurídica para atender, orientar e acompanhar, com sigilo e discrição, as vítimas e/ou os denunciantes. Além disso, a Sejus-DF relata que as polícias (Federal, Civil e Militar) e os órgãos competentes, como GDF e Ministério da Justiça, também ajudam nos trabalhos de investigação e prevenção contra os crimes de tráfico internacional e exploração de pessoas.
A Sejus-DF informa que pena prevista para quem cometer esse tipo de crime é de cinco a 12 anos de prisão, além do pagamento de multa. Para fazer a denúncia, basta ligar no número (61) 2104.1916.
Fonte: R7 DF.