Animal político, ex-presidente sempre apoiou sua trajetória na imagem; agora, com o câncer, não é diferente; a adversidade o fortalece no jogo eleitoral, incomoda adversários e o recoloca como candidato já; afinal, 2018, está longe demais
Brasil 247 – Marco Damiani – Uma nova imagem de Lula está no ar. Seus cabelos grisalhos e a grossa barba que os brasileiros se acostumaram a ver nos últimos 35 anos não adornam mais a sua face. Cuidadosamente, e diante das lentes do fotógrafo oficial, a ex-primeira-dama Marisa Letícia tratou de livrar o marido de duas de suas marcas registradas. Foi um combinado com ele próprio, que assim que soube ter câncer na laringe, quatro semanas atrás, resolveu mostrar ao público todas as fases e consequências do tratamento a que está sendo submetido.
Mas qual será o peso político da nova imagem de Lula? Gênio do empirismo, ele sem dúvida acertou mais uma vez ao se adiantar aos efeitos colaterais da quimioterapia. Eleito, reeleito e maior eleitor de sua sucessora Dilma Rousseff, Lula, antes do câncer, já se resignava em ter de dar o lugar de candidato presidencial a ela na eleição de 2014. Uma vez que ultrapasse sem sequelas o momento presente, com o câncer de agressividade média tendo sido superado, o quadro sucessório mudará radicalmente.
O fato é que a calvície de Lula muda tudo. Ao despontar em praça pública com um mártir que não teme, encara e se mostra pronto para vencer o câncer, o ex-presidente renova e amplia sua própria força, que já era a maior da política brasileira. Sindicalista que dobrou a ditadura militar, operário que venceu pelo sistema eleitoral da elite e, agora, homem que terá batido o câncer, Lula será visto nos rincões, sem dúvida, como um santo em pessoa. Às qualidades de líder de massas, orador virtuoso e exímio articulador, ele atua para acrescentar a de ser humano frágil como todos, porém forte como poucos. Não é por outro motivo que o novo Lula já assanha os difusores do conservadorismo, que apontam exploração política no modo como ele está enfrentando o câncer. Mas porque Lula deveria fazer diferente, encolhendo-se, deprimindo-se, ausentando-se?
O temor, entre os seus adversários, dos efeitos políticos a favor do personagem da doença apenas sustenta a projeção de que ele, sim, sairá politicamente ainda mais robusto do câncer. Certamente gostariam aqueles que Lula se entregasse em combate, mas o problema é que ele simplesmente não sabe fazer isso. Seu destino é mesmo lutar. Com todas as armas, entre elas a da imagem.
Na adversidade, a atitude de Lula já desperta não apenas compaixão, mas admiração. Neste momento, é correto imaginar que em milhares de lares brasileiros o ex-presidente seja beneficiário de orações, pensamentos positivos e também promessas que remetam à sua recuperação. A nuvem de solidariedade a Lula se estende pelo País de forma invisível e difusa, porém presente e crescente, especialmente agora que sua imagem despojada de combatente solitário é difundida.
Se faltava uma foto para resumir esse sentimento nacional e despertar o inconsciente coletivo, agora ela está ai, onipresente.