1° Parte – Imagine um sindicato envolvido em uma negociação de direitos trabalhistas cujo cálculo judicial ficou em torno de R$ 1 milhão em débitos, em setembro do ano passado. A primeira impressão é de que a entidade esteja lutando para defender os direitos de seus associados. Agora imagine que na verdade quem deve esse montante aos trabalhadores seja o sindicato. Pois bem: o Sindicato dos trabalhadores em Saúde do Distrito Federal (Sindsaúde-DF) está nesta situação.
Câmara em Pauta recebeu a denúncia documentada de um grupo de 20 pessoas entre funcionários e ex-servidores do Sindsaúde e, segundo os documentos, a pendência na Justiça do Trabalho é apenas uma pequena ponta de um enorme iceberg. Desde 2006 o Ministério Público do Trabalho tem conhecimento de várias destas questões, mas, segundo os denunciantes, a maioria não vai à frente, seja porque a diretoria do Sindicato faz acordos e os descumpre, ganhando mais tempo; seja porque consegue cooptar alguns dos ex-funcionários que foram à justiça, dentre outros motivos possíveis.
Situação atual – A energia foi cortada pela Companhia Energética de Brasília (CEB), por falta de pagamento; recentemente a entidade recebeu uma notificação de despejo da sede composta por seis salas no Edifício Nordeste, que fica no Setor Comercial Sul, pela falta do pagamento de alguns meses do aluguel, que custa R$ 27 mil.
Segundo os funcionários, os salários de janeiro foram pagos pela metade e há sete meses o auxílio-alimentação não é pago. Já os demitidos sem justa causa no fim de 2012 e início de 2013 afirmam não ter recebido os direitos trabalhistas. “Quando questionamos, a presidente [Marli Rodrigues], ela respondeu que procurássemos a justiça. Quando isso ocorre, o Sindicato paga a primeira parcela do acordo para normalizar a situação, depois para de pagar e alega que não tem dinheiro”, relata uma das testemunhas, que prefere não se identificar.
Repasses – O argumento não procede, segundo os denunciantes, já que, além do repasse mensal de R$ 1 milhão feito pelo GDF, a entidade recolhe do salário dos empregados o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), a contribuição do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), mas há mais de 10 anos que esses benefícios não são repassados aos órgãos.
Junte-se a isso o valor da contribuição sindical, que atualmente é de R$ 150,00, em uma entidade que possui 7 mil filiados, e teremos uma arrecadação mensal estimada em R$ 1.050.000. Além disso, há ainda a mensalidade sindical para o Sindicato de Entidades de Trabalhadores em Saúde (Sintes), que também é recolhida dos trabalhadores e não repassada, o que já rendeu ao Sindaúde uma multa de R$ 8 milhões.
A pergunta que fica no primeiro momento é: se o Ministério Público do Trabalho tem conhecimento destas e outras denúncias desde 2006, se em setembro do ano passado a Justiça do Trabalho calculou os débitos e até agora eles não foram pagos, o que acontece de fato para que os processos não vão adiante? Vale lembrar que o sindicato existe há 30 anos e durante 20 deles, os diretores são os mesmos, que só vão alternando de cargo, mas ao Ministério Público a alegação foi de “herança negativa da gestão passada”.
Outras denúncias – Há ainda a suspeita de tráfico de influências. “A diretora do sindicato nos disse que pagou R$ 200 mil a um procurador para que ele segurasse a carta sindical do Sindat”, relata outra testemunha. O Sindat seria a entidade análoga, para a qual os técnicos e auxiliares de enfermagem poderiam migrar, fazendo assim concorrência com o Sindsaúde.
Outros documentos comprovam depósitos feitos pelo Sindsaúde em contas de diretores ou familiares; denúncias de funcionários fantasma que só aparecem na sede da entidade para receber o salário, diretamente da diretoria do sindicato; “ajuda de custo” para diretores arbitrada em torno de R$ 50 mil em reunião fechada da cúpula e não votada em assembleia, como manda o estatuto; uso do dinheiro do sindicato para pagar despesas pessoais como compra de carro e custeio na abertura de empresa e até mesmo o custeio de uma campanha eleitoral para deputado distrital.
Nossa reportagem tentou falar com o Sindsaúde no número que consta como sendo da entidade, sem sucesso. Abrimos o espaço para que a diretoria se manifeste e responda aos questionamentos.
Breve estaremos publicando a segunda parte da matéria com documentados das denúncias.