Leishmaniose em cães aumenta no DF e CCZ recebe verba para combate de zoonoses

Publicado em: 02/12/2012

O Centro de Combate de Zoonoses do Distrito Federal receberá verba de R$ 295 mil para auxílio no controle de doenças causadas por animais. O dinheiro foi liberado no último dia 28 pelo Ministério da Saúde para o DF e mais 11 estados. A verba será usada para melhorias estruturais e combate a doenças transmitidas pelos animais. O local possui duas carrocinhas para atender a todo o DF e uma nova carrocinha deve ser utilizada, para atender chamados de donos de cães com suspeitas de doenças como a leishmaniose e a raiva.

A verba vem logo após a Secretaria de Saúde identificar um aumento dos casos de leishmaniose em cachorros. Em 2011, a capital teve 460 cães infectados e até agosto, 406 já tinham sido notificados, um aumento de 32,5% em relação ao ano passado. Também foram registrados casos da doença em humanos, sendo que nos primeiros oito meses deste ano, 20 pessoas foram diagnosticadas. Em outubro, se confirmaram mais seis.

 

Leishmaniose – Parte da verba será usada para combater a Leishmaniose, que é uma das principais preocupações da Secretária de Saúde. De acordo com a diretora de vigilância ambiental de saúde, Regina Scala, é preciso continuar com as ações de controle para que a doença não vire um problema. “O combate tem que ser prioridade. Tivemos muitos casos e é preciso um controle para novas pessoas não se contaminarem”, afirmou.

 

Os locais com maior foco da doença são o Lago Sul, Jardim Botânico, Sobradinho I e II e Fercal. Somente neste ano, seis pessoas foram confirmadas com a doença e, no ano passado, 400 cães foram sacrificados. O secretário de Saúde, Rafael Barbosa, aprovou um plano emergencial para controle de zoonoses e entre as principais ações estão a intensificação de campanhas para conscientização e treinamento de equipes para combate do mosquito palha responsável por transmitir a doença aos animais.

 

Atualmente, apenas clínicas veterinárias particulares disponibilizam a vacina, que não é reconhecida e distribuída pelo Ministério da Saúde e para garantir que o protozoário não seja transmitido, o Centro de Controle de Zoonoses do DF tem recorrido à eutanásia. Depois de três exames para testar a doença, se o resultado for positivo, o cão deverá ser recolhido para a eutanásia. “A gente espera que os centros de pesquisa achem algo que resolva o problema (da doença), porque nós somos os executores”, lamenta Laurício Monteiro, veterinário do Zoonoses.

 

O sacrifício é recomendado por uma portaria do Ministério da Saúde e do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, de julho de 2008, que determina a proibição do tratamento de leishmaniose em cães e estabelece que produtos de uso humano não podem ser indicados para controlar a doença em cachorros. Quem descumprir as determinações da norma poderá ser detido de um mês a um ano, além de pagar multa. Se o veterinário for o infrator, também sofrerá as sanções previstas no Código de Ética Profissional do Médico Veterinário.

 

Prevenção – Antes que o problema apareça, a recomendação é tomar providências para evitar a transmissão. Segundo Monteiro, o ponto mais importante é a limpeza do ambiente, para evitar o transmissor da doença, o mosquito palha. “É preciso remover toda a matéria orgânica: restos de vegetação, folhas e madeira em decomposição, podar as árvores de modo que o sol entre na copa e evite sombras grandes”, explica.

 

Os testes da leishmaniose devem ser feitos anualmente e são gratuitos no Zoonoses. As vacinas contra a doença são indicadas pelo órgão de controle, mas, como o Ministério da Saúde não as reconhece ou as distribui à população, a solução é realizá-las em clínicas particulares, anualmente. Há no mercado coleiras com deltametrina, que funcionam como repelentes e têm vida útil de quatro meses.

 

Os exames para o teste da leishmaniose em animais podem ser feitos gratuitamente no Centro de Controle de Zoonoses do DF (Setor de Áreas Isoladas Norte, Lote 4), de segunda a sexta-feira, das 8h às 16h. São feitos três testes para garantir que o diagnóstico é correto.

 

Sobre o atraso que significa a eutanásia e as possibilidades de tratamento, confira a entrevista com Dr. André Luis Soares da Fonseca, professor e veterinário especialista em Leishmaniose da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS).

 

Quais as causas da expansão da Leishmaniose no Brasil?

 

A causa principal da expansão da Leishmaniose no Brasil é a falta de técnica em controle do vetor. O país, infelizmente, é muito grande. Por uma questão assim, não dá para entender, a qualidade dos profissionais envolvidos, tanto ética, como tecnicamente envolvido no controle da leishmaniose é muito duvidosa. Temos muitos profissionais com doutorado e mestrado, mas sem uma capacidade crítica importante. Infelizmente isso até mostra uma falha no sistema de gerenciamento de cursos de pós-graduação.

 

A Portaria Interministerial 1429/2008, proíbe o tratamento do cão infectado e condena o cão à morte. O que o senhor pensa sobre isso?

 

Na verdade a Portaria não proíbe o tratamento do animal, ela proíbe o uso de medicamento de uso humano específico para tratamento da leishmaniose. Isso acontece justamente por uma questão de falta de visão técnica clara dos responsáveis por isso, porque na verdade não existe remédio veterinário, remédio humano, o remédio existe para tratar uma doença, ele age, por exemplo, sobre o DNA do parasita e não sobre o DNA do ser humano, então não tem lógica querer proibir. A Portaria simplesmente veta em termos o uso dos medicamentos tradicionais para uso no controle de leishmaniose, que na verdade é um grande engano.

 

Há risco para o ser humano conviver com o cão infectado?

 

Não há risco nenhum para ser humano conviver com o animal infectado. A Leishmaniose, como acontece no caso da dengue, é uma doença vetorial e a presença do animal doente em casa simplesmente indica que há presença do vetor naquele ambiente. Então, o controle de uma doença vetorial se faz o controle de vetor, é o que acontece exemplificativamente no caso da dengue, então risco não há.

 

Existem as verdades e mitos da Leishmaniose Visceral Canina. Se existe tratamento, por que tanta polêmica quanto ao uso de medicamentos?

 

Na verdade, o que acontece, é que no Brasil especificamente quer se implantar uma política de controle da leishmaniose através de eutanásia canina. Essa política foi implantada há mais de 15 anos, os resultados não apareceram, acho até que por uma questão de moral desses técnicos envolvidos, voltar atrás agora seria reconhecer incompetência, então por uma questão até de falta de brilho ético, por uma questão até de vaidade e de orgulho eles não querem voltar atrás nessa decisão e eles sabem que isso é ineficaz.

 

É possível o ser humano transmitir a doença?

 

Tanto o animal como o ser humano podem transmitir a doença. Existem duas formas de leishmaniose, a chamada zoonótica e antroponótica. A zoonótica é quando a transmissão é feita entre o ser humano e animais e animal com ser humano, quer dizer, uma via de mão dupla. Existe a antroponótica que é aquela em que o hospedeiro, principal transmissor é o ser humano, é o que acontece, por exemplo, na Índia.

 

No mundo nós temos 400 mil casos de leishmaniose aproximadamente por ano.

 

No Brasil, nós temos 4.000, ou seja, 1 % desse total. A Índia tem sozinha aproximadamente 260mil casos de leishmaniose visceral por ano. Na Índia a leishmaniose não é zoonótica, ou seja, não há participação do cachorro, simplesmente do ser humano, ela é antroponótica.

 

O ser humano pode transmitir a doença?

 

Pode sim. Tanto o ser humano como o animal, quanto mais infectado, maior a possibilidade de transmitir a doença. Por isso o tratamento tem essa eficácia de controle, ele reduz a carga parasitária, diminui o número de parasitas no animal, mas não pode ser usado como única terapia, tem que ser usado também o uso de repelentes constantes no animal e a dedetização e controle ambiental dos mosquitos no local onde tem o animal doente ou a pessoa doente.

 

O cão tratado é um transmissor ou portador?

 

São conceitos diferentes. O transmissor é aquele que é capaz de transmitir a doença, quanto mais sintoma tem animal, maior o risco dele transmitir. Posso ter um animal que é um transmissor e ter um animal que pode simplesmente ser um portador e não um transmissor. Acontece que, quanto menos sintomas há menor o índice o índice de transmissão desse animal. Voltamos à história, o tratamento se justifica por que diminui a carga parasitária, diminui o risco de transmissão e se você alia às técnicas sabidamente conhecidas e eficazes como o uso de coleira e repelentes, o índice de picadas diminui até 95%. Então voltamos de novo à mesma história, tratar o animal, usar repelente no animal e desinsetização do ambiente.

 

Retornando ao tema tratamento para que fique bem esclarecido ao leitor. Na Europa e em outros países os cães são tratados. Por que é proibido no Brasil?

 

Tratamento não é proibido no Brasil, o problema é que se quer dar interpretação da proibição. Primeiro, proibição de tratamento tem que ser mediante lei. O que existe é uma portaria restringindo o uso de medicamentos. No caso, por exemplo, da tuberculose, existe uma lei de 1942, que proíbe o tratamento de animais com tuberculose, mas em 1942 não existia ainda comercialmente a penicilina, então não tinha mesmo como tratar. Precisamos fazer uma interpretação mais moderna dessas leis antigas. Essas leis não foram recepcionadas pela constituição, então não existe proibição ainda.

 

Fonte: Jornal de Jales

Artigos relacionados