A Hemofilia é uma doença genética e hereditária que faz com que a pessoa não tenha a capacidade de conter sangramentos e pode ser letal. O tratamento consiste em aplicações da proteína que o corpo dos doentes não produz, mas o modo como isso é feito pela rede pública de saúde do Distrito Federal motivou um processo do Ministério Público do DF contra o secretário de Saúde, Rafael Barbosa.
No ano passado, o GDF fechou o Centro de Coagulopatias que funcionava no Hospital de Apoio e centralizou o atendimento aos hemofílicos no Hemocentro de Brasília. O serviço foi inaugurado oficialmente no mês de agosto. Segundo a ação, o MP alega que, além de deixar de oferecer um tratamento multidisciplinar e humanizado, o GDF abandonou o método preventivo de combate à doença, dando remédio apenas a quem já está sangrando.
O promotor Jairo Bisol, responsável pelo caso, afirma que a mudança humilhou e prejudicou a saúde dos pacientes. Um deles teria morrido em julho deste ano por causa da mudança. O depoimento de Geremias Cavalcante alegando que era bem tratado no Hospital de Apoio é usado para fundamentar a denúncia.
GDF – O secretário de Saúde, Rafael Barbosa, se defendeu das acusações informando que aplicou no DF o protocolo exigido pelo Ministério da Saúde no tratamento de hemofílicos e que havia irregularidades. “Quando assumimos, a desordem imperava na área. Os pacientes recebiam remédios indiscriminadamente, sem prescrição. Havia corrupção”, afirmou Barbosa. Ainda segundo ele, o tratamento preventivo continua, quando há indicação médica.
O governador Agnelo Queiroz (PT) também negou as acusações. “Se o MP quer luta política contra o GDF, nós é que vamos representar contra eles no Conselho Nacional de Justiça”, disse. O órgão divulgou nota repudiando as acusações e informando que a denúncia foi fundamentada apenas em critérios técnicos.
Leia abaixo a nota do GDF e a resposta do MPDFT na íntegra.
NOTA À IMPRENSA – GDF
A respeito de nota divulgada por um promotor do DF, eu gostaria de informar que:
1) Para realizar o atendimento aos pacientes com coagulopatias hereditárias, as administrações anteriores patrocinaram uma série de desmandos e irregularidades.
2) Nas administrações anteriores, a Secretaria de Saúde fornecia medicamentos sem qualquer controle, o que elevava indevidamente as faturas pagas aos laboratórios fornecedores. Houve caso de medicamento coagulante fornecido pela Secretaria de Saúde do DF encontrado à venda em mercado clandestino em Minas Gerais.
3) Para romper com aquele modelo pernicioso e melhorar o atendimento aos pacientes com coagulopatias hereditárias, a minha administração tomou as seguintes medidas, em boa parte sugeridas pelo Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (Denasus), pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal e pela Vigilância Sanitária:
a) Trocou a chefia do setor.
b) Determinou o recadastramento de todos os pacientes com coagulopatias do DF.
c) Instituiu um Protocolo de Diretrizes Clínicas, para adequar o tratamento propiciado aos pacientes com diferentes coagulopatias.
4) O dito promotor moveu ações contra a troca da chefia no setor, contra o recadastramento dos pacientes e contra o Protocolo de Diretrizes Clínicas, configurando sua defesa veemente e descabida do modelo anterior, cabalmente condenado pelos órgãos de controle em relatórios de auditoria.
5) Após o recadastramento, o número de pacientes do Distrito Federal com coagulopatias hereditárias caiu de 474 para 180, o que permite não só o melhor uso dos escassos recursos públicos como melhor atendimento ao grupo de pacientes que realmente precisam do tratamento.
6) O novo modelo oferecido aos pacientes com coagulopatias inclui a entrega dos medicamentos em domicílio, se assim eles quiserem.
7) O novo modelo garantiu aos pacientes com coagulopatias hereditárias atendimento multidisciplinar num lugar próprio para tanto, o Ambulatório do Hemocentro, tal como orienta o Ministério da Saúde. O modelo anterior, do qual o dito promotor é defensor, fazia o atendimento no Hospital de Apoio de Brasília, onde o Denasus encontrou uma série de irregularidades, como a inadequação do espaço físico e a inexistência de equipamentos para realização de exames de diagnóstico e de acompanhamento terapêutico.
8) O novo modelo de atendimento aos pacientes com coagulopatias hereditárias encontrou excelente aceitação pelos próprios pacientes. Tanto é que dois dias atrás a Secretaria de Saúde do Distrito Federal recebeu carta da Associação Brasileira de Hemofílicos em que a instituição afirma: “Queremos cumprimentá-lo e reafirmar nossa satisfação em relação ao atendimento das pessoas com hemofilia no Distrito Federal. Estamos acompanhando desde o início de sua gestão essas melhorias”.
9) O Governo do Distrito Federal mantém uma relação absolutamente cooperativa com o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e eu, governador, tenho especial apreço pelo trabalho dessa importante instituição do nosso país.
10) O dito promotor demonstra comprometimento e inexplicável apego a um modelo equivocado e eivado de desmandos, com o qual minha gestão rompeu definitivamente, assim como vem rompendo com modelos semelhantes em todos os setores da administração pública.
Agnelo Queiroz – Governador do Distrito Federal
MPDFT vai continuar buscando tratamento de excelência para os hemofílicos
No último dia 16, a 3ª Vara da Fazenda Pública do DF concedeu, parcialmente, medida liminar pleiteada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), que considera irregular a exclusão de pacientes hemofílicos de fora do DF do tratamento que há anos recebiam. A decisão exarada, em sede de liminar, não esgota a questão.
O MPDFT estuda o oferecimento dos recursos cabíveis, mas, desde já, comemora a vitória parcial, por meio da qual serão mantidos pacientes antes excluídos do protocolo, em ofensa à universalidade do SUS. É o caso, por exemplo, de uma mãe, carente de recursos, que há 120 dias encontra-se no DF, à espera do fator de coagulação necessário para garantir uma vida digna a seu filho que, há mais de sete anos, recebia tratamento na cidade. Apesar de obter liminar em mandado de segurança ajuizado pela Defensoria Pública do DF, a medicação não foi disponibilizada, ao argumento de que se trata de paciente de fora do DF.
No dia 25 de outubro, o MPDFT ajuizou pioneira ação (autos 2011.01.1.205420-4) no Brasil questionando a aprovação do primeiro protocolo clínico para tratamento da hemofilia no DF. Com a entrada em vigor da Lei 12.401/11, em 30 de outubro de 2011, o SUS passou a arcar apenas com tratamentos e medicamentos previstos em protocolos e na Rede de Medicamentos (Reme). A ação visa ao controle de legalidade e legitimidade do protocolo recém-aprovado por parte do Judiciário, nos termos da jurisprudência majoritária do Supremo Tribunal Federal (STF).
O MPDFT e o Ministério Público de Contas do DF não são contrários a aprovação de qualquer protocolo. O que se questionou foi a aprovação sem base em evidência científica e com cláusulas restritivas, inadmíssiveis em um Estado Democrático de Direito, como a exclusão dos pacientes que atingirem a maioridade e daqueles de fora do DF.
Em audiência realizada com o Poder Judiciário, o coordenador da Hematogia da Secretaria de Saúde do DF reconheceu que o protocolo aprovado teve como base, apenas em parte, o Protocolo Canadense (de Blanchet), mas sequer citou-o nas referências bibliográficas, item obrigatório de qualquer Protocolo e que comprovaria a aprovação dos seus termos em consenso científico ou mundial. Para o MPDFT, esse fato é grave e macula o protocolo aprovado.
Além disso, o protocolo criou um Comitê, composto de leigos, o qual passou a ter a incumbência de se manifestar a respeito de casos clínicos, sem a oitiva do médico assistente e sem consulta clínica ao paciente. Somente após o ajuizamento da referida ação, a Secretaria de Saúde passou a afirmar que os casos clínicos seriam examinados, agora, por uma junta médica, além de afirmar que já está revendo o protocolo aprovado.
A atuação do MPDFT, no caso, vem desde 2007, em parceria com os Ministérios Públicos de Contas e Federal. Foram ajuizadas três ações de improbidade administrativa no decorrer desses anos, além de uma ação civil pública que tramita na Justiça Federal. No Tribunal de Contas da União, foram ofertadas importantes representações, que culminaram com decisões e auditorias, questionando a política pública desenvolvida pelo Ministério da Saúde, que, ao final, reconheceu ser necessário o tratamento profilático e com recombinantes, apesar de não haver sido implementado até o momento.
Por fim, o MPDFT, em parceria com o MPF, investigou denúncia envolvendo venda irregular de fator de coagulação que, até o momento, não restou confirmada. Ao revés, o apontado receptador está promovendo ações civis e criminais por meio das Defensorias Públicas da União e do DF, com o objetivo de ver reparada a sua honra contra todos os que divulgaram ou repercutiram a denúncia em questão. Toda a documentação obtida no DF pelos Ministérios Públicos que aqui atuam está em poder da Polícia Federal.
MPDFT