CULTURA, 2011: O ano que não existiu no MinC

Publicado em: 29/12/2011

Artigo de *Andrea Saraiva no Chafurdo Mental, o Blog – O baque ocasionado pelos constantes sobressaltos no meio cultural, notadamente no âmbito do MinC, desnorteou os fazedores de cultura do país. Vindos de uma política de governo a qual recebiam financiamento para executarem ações, os equipamentos culturais esparramados pelo brasil, também conhecidos como pontos de cultura sofreram grave ruptura de política e pactuação. Uso os pontos de cultura como exemplo, por ser o ponto congregador e a mais sucedida dentre as ações do programa Cultura Viva, mas além dos Pontos, Pontões e Pontinhos, existiam outras ações como a cultura digital, economia viva, tuxauas, interações estéticas, agentes de cultura, griôs, mídia livre e outras tantas.

O rompimento mais pernicioso foi na relação sociedade civil X governo. A nova gestão simplesmente rompeu o diálogo e tomou decisões unilaterais. Não houve respeito com o processo de construção de políticas que vinha se consolidando ao longo de seis anos e estava se encaminhando para dirimir distorções.

A Teia, canal legítimo de diálogo e que congregava o vasto caldeirão da diversidade cultural brasileira, foi cortada deliberadamente. O evento, realizado anualmente, marcava o momento de juntar e mostrar o Brasil desescondido. Era um momento também de construções coletivas de políticas, de afinamento, de proposição, de pactuação. Além da Teia, havia outros canais de encontro setoriais/temáticos que também foram sumariamente rompidos.

Além da ruptura no compartilhamento da gestão, a própria execução das ações foi sendo direcionada para abolição do Programa. Se não há diálogo, se não há acompanhamento técnico, se não há um plano de trabalho, na prática o programa se esvai. É isso que estamos presenciando. Mas se há essa percepção, o MinC jura de pés juntos que a nova gestão continua apoiando o programa e mostra como prova, o pagamento dos editais. Ora, não basta pagar os editais e isso sequer pode ser considerado mérito, e sim obrigação vez que a verba dos tais editais estavam assegurada pela gestão anterior.

Por outro lado – e talvez mais preocupados com a liberação do pagamento dos editais do que com a nefasta composição do novo velho MinC – os fazedores de cultura assistiram às constantes afrontas dos novos gestores ao que foi sendo cuidadosamente construido na gestão anterior. Até então desconfiava-se de que essa política devia-se as rusgas de comadres entre Antonio Grassi que fora afastado da FUNARTE na gestão anterior e sendo ungido como o interlocutor do PT, estaria de vingancinha contra os antecessores que, por exigência de Dilma que queria que a titular fosse do gênero feminino, indicara Ana de Hollanda como seu fantoche.

Infelizmente a ruptura e estagnação não era privilegio apenas de uma Secretaria. Outros setores do Ministério também se mostraram inertes, sem verba, sem diretriz.

O buraco mostrou-se mais subterrâneo. Desde a retirada da licença creative commons do portal do ministério, fomos ao longo do tempo bombardeados com justificativas ainda piores que o ato. Tais desculpas demonstraram em um só tempo, o despreparo técnico, a inabilidade política da atual ministra e a ligação umbilical com a indústria fonográfica e com o escritório de arrecadação de direitos autorais. Aos poucos foi se percebendo o alinhamento ideológico com órgãos internacionais inimigos precípuos da liberdade do conhecimento. Não era só inoperância e má qualificação tecnica. Era alinhamento político com setores mais conservadores das artes e da indústria cultural.

Mas no decorrer do ano, a gestão Ana de Hollanda foi mostrando sua forma e isso ocasionou inúmeros questionamentos. Como os protestos se avolumavam, acuados, martelavam o sofisma de que ‘continuar não é repetir’ para justificar-se frente à acusação de retrocesso e de que estariam traindo a gestão anterior. A cortina caiu e constatamos, não sem algum pesar, de que a nova gestão do MinC nem continuou, nem repetiu. Fez pior, sequer existiu em 2011.

2011 não foi ano da cultura. E o que nos (des)espera em 2012?

 

* Andrea Saraiva é historiadora, escritora, autora do livro Orélio Cearense: Dicionário Ilustrado e Romanceado de termos e expressões do palavreado do Ceara e o Livro “Existe Vida cultural além de editais?”.

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