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Professora e candidata laranja do PSL diz que ministro do Turismo sabia de esquema para lavar dinheiro

Publicado em: 19/02/2019

Em entrevista aos repórteres Camila Mattoso e Ranier Bragon, na edição desta terça-feira (19) da Folha de S.Paulo, a professora aposentada Cleuzenir Barbosa, que foi candidata a deputada estadual pelo PSL em Minas Gerais nas últimas eleições, disse que se encontrou com Jair Bolsonaro (PSL) e que o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, sabiam do esquema de lavagem de dinheiro de recursos do fundo partidário usando candidatas mulheres.

“Era o seguinte: nós mulheres iríamos lavar o dinheiro para eles. Esse era o esquema. O dinheiro viria para mim e retornaria para eles”, afirmou em entrevista à Folha. Em sua página no Facebook, Cleuzenir também posa ao lado de Eduardo Bolsonaro (PSL/SP).

Segundo ela, no caso de Minas, a verba foi liberada formalmente pelo então presidente nacional da sigla, Gustavo Bebianno, demitido do cargo de ministro da Secretaria-Geral da Presidência nesta segunda-feira (18).

Álvaro Antônio era o comandante da sigla em Minas, responsável pela montagem das chapas. Parte do dinheiro público foi direcionado a quatro candidatas do PSL mineiro apenas para preencher a cota feminina de 30% das candidaturas e de verba eleitoral.

O dinheiro enviado a elas foi parar na conta de empresas de assessores, parentes ou sócios de ex-assessores do atual ministro do Turismo.

Cleuzenir, que pediu asilo político a Portugal, diz que saiu do Brasil por medo. “Me mudei exclusivamente por causa dessa situação. Peço para as mulheres que denunciem. Não fiquem caladas, se exponham, sim. Eu vou entrar com pedido de proteção à vítima. Esse povo é perigoso. Hoje eu sei, eles são uma quadrilha de bandidos”.

Como a sra. virou candidata? Sou de uma família cristã e a gente sempre fez trabalho social. Decidi aceitar o convite para sair candidata para ampliar o trabalho que já fazia.

O que era o esquema?Era o seguinte: nós mulheres iríamos lavar o dinheiro para eles. Esse era o esquema. O dinheiro viria para mim e retornaria para eles. Esse era o esquema. R$ 10 mil foi o que me falaram que eu poderia ficar, foi aí que eu vi que tinha erro. Eles falaram que eu poderia fazer o que eu quisesse. Onde já se viu isso?

A sra. viajou para o exterior por medo? Me mudei exclusivamente por causa dessa situação. Peço para as mulheres que denunciem. Não fiquem caladas, se exponham, sim. Eu vou entrar com pedido de proteção à vítima. Esse povo é perigoso. Hoje eu sei, eles são uma quadrilha de bandidos.

Como foi seu contato com o PSL? Através de um deputado, que hoje até está ocupando a vaga do Marcelo Álvaro Antônio, como suplente [Enéias Reis]. Ele estava indo para Brasília e nós fomos. Bolsonaro nos recebeu, Marcelo também. E aí veio o convite para me filiar no PSL. Jair fez um vídeo pedindo apoio para a minha candidatura. Até então, estava tudo correndo dentro do script. Não foi falado em dinheiro, só de apoio.

E como veio a oferta do dinheiro? Quem ficou responsável pela minha região foi o Haissander de Paula (assessor do ministro), que começou a falar que ia vir um dinheiro. Ele falava que o Marcelo [ministro] estava muito apertado, coitadinho, e que a mãe ia doar um dinheiro pra campanha dele. Era uma história comovente. Que precisava ajudar outros candidatos com esse dinheiro.

Falaram que a mãe do Marcelo mandaria na minha conta R$ 50 mil. E que eu poderia contratar pessoas, que viria o dinheiro da mãe do Marcelo, para fazer a campanha “Jair Bolsonaro, Marcelo Álvaro Antônio e Cleuzenir Barboza”.

Quando caiu na minha conta, falei: caiu o dinheiro, mas não sei a origem, preciso ver. Quando ligo pro Robertinho falo que não é dinheiro do fundo da mulher nem da mãe do Marcelo. Ele respondeu: é o mesmo. Aí quando ele falou isso, caiu a ficha.

O que a sra. entendeu? No meio disso, já tinha tido pedido do Haissander para transferir para a gráfica [I9 Minas Assessoria, de propriedade de um irmão de Robertinho] R$ 30 mil e que o resto ele pagaria do bolso dele. E que R$ 10 mil eu poderia fazer o que eu quisesse. E aí vi que era do fundo de campanha [público]. Como eu vou transferir, sendo que ele me pediu para arcar com as responsabilidades? Quando eles viram que não caí no esquema, não prestei para mais nada. Impediram que eu tivesse acesso à agenda do Marcelo.

Em conversa que a sra disse ao Ministério Público ter tido com outros assessores, a sra contou toda a situação? Toda. Antes de eu ir ao Ministério Público, eu me desloquei duas vezes para Belo Horizonte, que é longe, para falar com o PSL, o Aguinaldo [chefe de gabinete do escritório em Minas]. Chamei e falei: aconteceu assim, tá aqui os prints da conversa. O Robertinho e o Haissander fizeram isso. E eles não falaram nada. A polícia tem os áudios. Eu liguei para Brasília, falei com Jane, que é assessora do deputado. Eu falei: Jane, eu preciso falar com o deputado [Álvaro Antonio]. Contei tudo pra ela. E ela: quem resolve é o doutor Aguinaldo. Eu liguei pra ele depois, contei de novo. Ninguém fez nada.

Como foi que pediram pra depositar pra gráfica? Eles passaram o papelzinho da gráfica. Que era pra transferir R$ 30 mil. Aí, dentro do banco, meu irmão foi ver de onde era a gráfica e viu que era de Ipatinga.

A sra. conseguiu falar com Marcelo Álvaro? Não. Não me deram resposta. Eu mandei mensagem no privado [redes sociais] do deputado algumas vezes. Pelo amor de Deus, deputado, preciso falar com o senhor. Eu queria falar com ele, mas hoje eu entendo que ele sabia de tudo.

Por que acha que ele sabia de tudo? Ah, sabia. Sabia. Sabia.

Por que você acha? Esse Robertinho Soares é assessor dele há alguns anos. Eu contei pra Jane, em Brasília, também [é assessora dele]. O Agnaldo também trabalha há anos. Será possível que esses senhores iam pensar que isso poderia ficar impune? Ou não era uma ordem do chefe para fazer esse tipo de situação?

Na mensagem pra ele, explicou o que era? Eu não cheguei a explicar, disse que precisava falar urgentemente. Eu tinha falado com o Robertinho, com o Agnaldo, com o Jandir, com a Michele [dois outros assessores. Ao Ministério Público, ela cita também outra pessoa, de nome Gustavo], que eu queria falar com ele.

Os assessores disseram que lhe procuraram apenas para orientar porque a senhora estava repassando dinheiro a familiares... O único que trabalhou comigo foi o meu irmão, com autorização dos meus advogados [recebeu R$ 4.000, segundo sua prestação de contas]. Dos outros, ninguém nunca teve cargo político. O pessoal lá tem concurso público. Essa é a mais esfarrapada mentira.

Eles também afirmam que a sra se aposentou sob alegação de problemas mentais. Sou portadora de artrite reumatoide, que é uma doença incapacitante, que pessoa não pode trabalhar, mas para um cargo eletivo qualquer um pode concorrer. Pode estar em cima da cama. Com essa situação, de artrite reumatoide, eu fico com dor 24 horas por dia. Eles estão falando que eu sou louca. Quero deixar claro que a artrite é acompanhada por uma junta médica, com vários profissionais, inclusive psicólogos e psiquiatras. Como tem nutricionista e ortopedistas. Se eles insistirem com isso, eu vou querer passar por um teste psicológico. Agora eu fiquei louca?

Como a sra. sai dessa experiência? Com vontade de continuar lutando. O tempo agora é expor esse esquema podre que existe na política.

O ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio (PSL-MG), afirmou que tomou conhecimento da denúncia por lideranças partidárias e que determinou sua apuração.

“A denunciante foi chamada a prestar esclarecimentos em diversas ocasiões e nunca apresentou provas ou indícios que atestassem a veracidade das acusações”, disse o ministro.

Ele também afirmou que Cleuzenir não tem credibilidade por ter sido “aposentada por sentença judicial que reconheceu distúrbios psiquiátricos incapacitantes total e permanentes”. Ele também disse que ela repassou a familiares dinheiro da campanha e que fez elogio público a ele um dia antes de registrar o boletim de ocorrência.

Jane de Mattos, que era assessora de Álvaro Antônio na Câmara, confirmou à Folha ter recebido o relato de Cleuzenir à época e que repassou o caso para a assessoria de Minas. A Folha enviou perguntas a Aguinaldo Mascarenhas Diniz, mas não obteve resposta.

Robertinho Soares, outro assessor, disse que “nunca houve nenhuma ameaça à senhora Cleuzenir”. Ele também afirmou que ela se contradisse em suas acusações. Haissander de Paula não respondeu às perguntas.

Leia a reportagem na íntegra.

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